sábado, 7 de dezembro de 2013

"Eu fui obrigada a conhecer o avesso do mundo": texto de Fauzi Arap

"Eu vou lhe contar que você não me conhece. Eu tenho que gritar isso porque você está surdo e não me ouve...".  Um hino para os fãs de Maria Bethânia este texto é de Fauzi Arap,   introduz Um Jeito Estúpido de Te Amar (Isolda e Milton Carlos) no disco Pássaro da Manhã (1977) e frequentou bastante as redes sociais no dia da morte de Fauzi (quinta, 5 de dezembro). Há outro texto incrível de Fauzi no show Pássaro da Manhã, nunca lançado em disco, mas disponível para baixar na internet. No final, vai o mapa da mina e o texto, mas antes uma historia.

Programa do show Pássaro da Manhã
Desde que comecei a ouvir Bethânia me encantei com Fauzi Arap, com o nome dele nos créditos, mas só muitos anos depois assisti a um show Dela com direção Dele. E houve um dia Imitação da Vida, maravilha de show da Bethânia dirigido por Fauzi e que para mim foi como se eu tivesse visto o encantado Rosa dos Ventos (sei lá o que daria pra ter assistido esse show). Era dezembro de 1996, assisti com Olair Coan, que era amigo de Fauzi e, ao final, foi cumprimentá-lo e me apresentou a ele. Tenho dificuldade pra tietar, mas não resisti. Fui logo dizendo que enlouquecera com Mare Nostrum, o livro de memórias dele que tinha acabado de sair, e já tinha lido duas vezes. O homem, que era reservado, me olhou com uma cara entre assustado e satisfeito  e disse bem humorado "duas vezes você leu o meu livro, tenho que dar atenção especial". E ficou ali de conversa com o Olair e comigo. Perguntei quem era o autor de um texto absurdo no show. Ele disse que não sabia, achava que era do José Vicente, mas que Bethânia havia encontrado entre seus guardados e não tinha certeza.

Bom, abaixo o lindo texto de Fauzi Arap que introduz o bolero Pecado, quase ao final do 1º ato do show Pássaro da Manhã.

"Eu fui obrigada a conhecer o avesso do mundo. Pra sobreviver a dor de não entender o que tinha acontecido, à dor de te perder, tudo. Eu tive que nascer pra vida da cidade. Não a vida social, mas a vida da cidade e de seus cantos esquecidos. O lixo do lixo. Eu me perdia pela cidade, anônima, e esse anonimato era um vício. Eu não ter meu nome me absolvia de tudo. Eu me embebedava do desejo cego por qualquer um... E assim, eu me iniciei na solidão coletiva dos que não têm nada a perder. Mas, talvez, eu tenha até mais que os outros a tentação de corresponder ao bem. Uma tentação tão grande e absoluta, um desejo de corresponder de forma tão total, que paradoxalmente me tornou e me torna escrava cega de minha escuridão. E quando essa escuridão me possui, eu até a confundo com uma espécie de bem-aventurança."

Mapa da mina. Lindeza de texto, né? E na voz de Maria Bethânia, então, é de arrepiar. Para ouvir, é só acessar o incrível blog Maria Bethânia Re (verso) e baixar o show Pássaro da Manhã. E lá tem outros incríveis shows de Bethânia, inclusive o lendário Rosa dos Ventos, lançado em CD sim, mas em versão reduzida. Eis o link:

E aqui "Eu vou lhe contar...", na voz de Bethânia



3 comentários:

rafael disse...

Muito bom o texto,abraço.

Ana disse...

Vilmar, "Imitação da vida" foi o primeiro show de Bethânia que pude ver ao vivo, depois de saber de cor "Rosa dos ventos" e " Drama 3. ato". Não tive a sorte de estar com o Fauzi Arap depois, como você, apenas... Lindo texto" obrigada!

Anônimo disse...

Vilmar, esse texto me emocionou
Louise Cardoso

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